Equipa da Câmara de Lisboa na Caça ao IMI

 

Isabel Tavares (ionline) e António Frias Marques

12-nov-2014

 

 

Os imóveis vazios pagam a triplicar. A capital tem 4681 edifícios nestas condições. A CML é a maior senhoria mas está isenta de imposto
 
 

 

A Câmara Municipal de Lisboa (CML) tem "brigadas de jovens" nas ruas da capital a tomar nota das casas que estão devolutas e que por isso, em vez de estarem sujeitas à taxa de IMI (imposto municipal sobre imóveis) regular, rendem o triplo da receita fiscal.

 

Esta informação foi confirmada ao i pelo vereador do Urbanismo, Manuel Salgado. A CML tem um serviço específico, dependente da Unidade de Coordenação Territorial, que faz uma análise técnica prévia com cruzamento de diversa informação, nomeadamente das empresas concessionárias de água, energia e gás, e que é complementada com informação das equipas de fiscalização no terreno, dependentes de cada unidade de intervenção territorial.

 

Depois de recolhidos os dados, a autarquia reporta-os periodicamente à Autoridade Tributária e Aduaneira para agravamento do IMI dos edifícios/fracções devolutos ou em ruínas. Além de pagarem IMI a triplicar por uma casa desocupada, os proprietários podem ser intimados a fazer obras de conservação.

 

Nos últimos 14 anos, a CML gastou 34 milhões de euros em obras coercivas em 246 edifícios. A reabilitação da cidade, com base no censo de 2011, custaria 8 mil milhões de euros. O objectivo traçado até 2024 implica reabilitar 7 mil edifícios em ruínas e mau estado, uma média de 500 por ano, de acordo com declarações de Manuel Salgado ao i. "Não me parece uma meta inalcançável, apesar de o mercado estar praticamente parado, mas estou convencido que daqui a dez anos talvez se possa acelerar este ritmo", disse então. De acordo com os últimos dados disponibilizados pela câmara, Lisboa tem 6977 edifícios em mau estado, 1297 em muito mau e 2813 devolutos. Cerca de 82% dos edifícios têm mais de 30 anos. No entanto, informação mais recente revelada pela Associação Nacional de Proprietários (ANP) mostra que existem na capital 4681 prédios devolutos (cada prédio tem vários fogos).

 

Em 2015, a CML prevê arrecadar 108,9 milhões de euros de receitas totais de IMI, mais 4,9 milhões que o estimado no orçamento deste ano.

 

ÁGUA, LUZ E GÁS COLABORAM Os métodos adoptados pelas diversas câmaras para detectarem os prédios devolutos não diferem muito. Em Faro, por exemplo (ver caixa lateral), uma equipa multidisciplinar trabalha há quatro anos exclusivamente na identificação e constituição de prédios devolutos e respectivos processos. O procedimento encontra-se normalizado: "Após visita ao local, identificamos o imóvel com aparência de devoluto; são recolhidos os dados de cadastro e verifica-se a existência de contratos em vigor com empresas de telecomunicações e de fornecimento de água, gás e electricidade", explica o gabinete do presidente da câmara. Constatando-se a inexistência de contratos, os proprietários são notificados no âmbito da audiência de interessados, para confirmação das excepções aplicáveis na lei.

 

O recurso às companhias de gás, água, electricidade e telecomunicações está previsto na lei (Dec. Lei 159/2006), que diz que estas empresas devem cooperar. A Comissão Nacional de Protecção de Dados (CNPD) disse ao i que neste caso não existe transmissão de dados pessoais. O que as câmaras pretendem saber é, primeiro, se existem contratos associados àquele imóvel e, em caso afirmativo, se são registados consumos. A CNPD chegou, aliás, a ser consultada por uma companhia de electricidade que pretendia saber se podia informar uma autarquia em nome de quem estavam registados os contratos. A resposta foi negativa, já que essa informação não faz parte dos dados pertinentes ao abrigo da colaboração sugerida no decreto-lei, até porque o contrato, a existir, não tem de estar em nome do proprietário do edifício em causa e o registo predial é público, lembra a CNPD.

 

O presidente da ANP, António Frias Marques (ver entrevista), lamenta que os proprietários sejam penalizados com o triplo do IMI por não conseguirem arrendar os imóveis. Sobretudo tendo em conta que a CML é o principal senhorio de Lisboa: a capital tem 57 449 edifícios (perto de 250 mil fogos) e destes 33 mil são propriedade da câmara. As casas para arrendar concentram-se em Lisboa e no Porto - calcula-se que existam 45 mil em Lisboa e 20 mil no Porto para alugar.

 

Este ano a receita total de IMI (Abril e Julho) vai em mais de 2 mil milhões, mais 20% que em 2013, e ainda falta contabilizar o mês de Novembro. A carga fiscal aumentou 8,8% (só o IMI 27,8%) de 2012 para 2013, de acordo com o Banco de Portugal.

 

P&R

 

António Frias Marques 
Presidente da Associação Nacional de Proprietários

 

O valor do IMI, em alguns casos, aumentou sete vezes. Faz sentido este imposto? 

Há impostos que não têm razão nenhuma, e este é um deles. Além de que há dois pesos e duas medidas, porque os imóveis das câmaras, que são os maiores proprietários, estão isentos de pagamento. Reconheço que não nos podemos dar ao luxo de acabar com estes impostos de um dia para o outro, mas temos de pensar nas coisas.

 

O país tem uma grande percentagem de imóveis devolutos. Porquê? 
Em Portugal fez-se uma coisa própria de um país de tolos: com uma população, números redondos, de 10 milhões de habitantes, construiu-se para 15 milhões. E não acontece nada aos promotores imobiliários, às câmaras que fomentaram ou às entidades bancárias que patrocinaram isto.

Lisboa teve um programa de obras coercivas. Resultou? 


O programa acabou e não sabemos quando é que a dívida da câmara será paga. Além de que as câmaras andaram a intimar os senhorios a fazer obras e, porque estes não tinham dinheiro para as realizar, confiscaram-lhes os imóveis. Mas depois as câmaras também não fizeram obras, ou as que fizeram foram tão mal feitas que já está tudo a cair. Foi o que aconteceu em Lisboa, e é de legalidade duvidosa, por exemplo na Rua do Crucifixo, com o Prédio das Palmeiras.

 

Nalgum ponto o senhorio falhou, para haver prédios a cair... 
De dez em dez anos os prédios ficam obsoletos e é preciso reinvestir, embora a lei fale em oito anos. Alguns edifícios intervencionados pelo programa de obras coercivas já estão a precisar de novas intervenções. A CML é o principal proprietário de Lisboa e ninguém pergunta como é que os imóveis lhe foram parar às mãos.

 

O parque imobiliário está obsoleto. Não se deita nada abaixo? 
Penso que nem tudo deve ser reabilitado, até porque não há dinheiro. O Recria [Regime Especial de Comparticipação na Recuperação de Imóveis Arrendados] foi dinheiro deitado fora. A reabilitação atingiu valores muito elevados e gastou-se a reabilitar casas em que se sobem as escadas e o prédio abana, não têm casas de banho e os quartinhos são minúsculos.

 

FIM


 

 

  
 
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